Uma ideia…

A frase pensada para abrir este texto se perdeu no caminho: metaforicamente, em algum escaninho de uma memória nada prodigiosa; literalmente, porque estava no ônibus e não a anotei. Confiei que fosse boa o suficiente para ser lembrada em momento posterior. Boa talvez, mas – sabemos agora – não inesquecível.

Sobram-me a página em branco, a sensação de impotência e a culpa. Como recuperar um pensamento perdido? Por onde se começa a vasculhar? Nenhuma ideia. O olhar percorre os recônditos da sala em vão. Não há pista sequer do tema.

O jeito é admitir a derrota e buscar outra maneira de abrir o texto. Apelo para o truque mais barato que um escritor pode empregar: lamentar a perda de uma ideia. O clichê se perpetua graças ao leitor, que avança na leitura à espera de que a literatura encontrará a frase irrecuperável alguns parágrafos adiante.

Derrotado, o autor busca salvar sua obra a qualquer custo. Iludido, o leitor aguarda com ansiedade um desfecho original. Esquecem-se ambos de que a expectativa é a mãe da decepção. Peço desculpas a todos: este texto não tem salvação.

Imagem: Lost (2017), de Michael Lang

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